Em 2023, publiquei a primeira retrospectiva quadrinística aqui do blog e foi algo bem improvisado. Como havia explicado, lá no texto do ano passado, a ideia surgiu enquanto escrevia a minha lista de melhores quadrinhos lidos e aos trancos e barrancos fui recuperando dados, fatos e notícias relacionadas ao universo da nona arte. 

Gostei do resultado, mas resolvi amadurecer a ideia e ir tomando notas no decorrer do ano sobre tudo aquilo que considerei relevante, além de tentar buscar algumas informações na fonte. Quase que um trabalho de escriba, porém tendo a consciência de que não conseguiria compilar tudo. Então, entenda o texto abaixo como um rasante por aquilo que aconteceu durante o ano e que tenha me chamado atenção a ponto de anotar. Eventualmente, vocês irão perceber que não foi pouca coisa.

Tentar elencar os eventos em ordem cronológica e também por tema e como não poderia deixar de ser, 2023 começou com uma pequena treta que mexeu com a gibisfera. Portanto, atenção que a retrospectiva está para começar. 

A gibisfera, as editoras e os pequenos influenciadores (Jan-Fev)

No primeiro bimestre do ano (jan-fev) editoras como Pipoca & Nanquim, Comix Zone, Mino, Devir, JBC e outras realizaram os seus processos seletivos para novas parcerias. Algo de praxe e que normalmente movimenta toda a gibisfera, afinal de contas uma possível parceria com uma dessas editoras é algo almejado por qualquer pessoa que trabalhe com divulgação de quadrinhos (inclusive eu mesmo). 

Os motivos para isso são vários, mas em tempo de alta nos preços dos quadrinhos junto com a divulgação oferecida pelas próprias editoras, em suas redes sociais, ser contemplado com uma dessas parcerias é algo pra lá de promissor. Pelo menos até a página dois de todo esse processo. 

Em 2023, o que se viu foi uma verdadeira revolta com a falta de clareza dos pontos a serem analisados pelas editoras, problemas na divulgação dos selecionados, ausência de retorno à inscrição e a escassez de representatividade nos escolhidos pelas editoras. 

O que foi apontado por vários gibitubers e outros influencers no Twitter e acabou gerando um debate bem interessante. Onde, além das falhas apontadas, se discutiu alguns pontos do mercado nacional como:

  • a tokenização de influencers negros e LGBTQIAP+
  • quantidade X qualidade de posts
  • panelinha

Dentro desta discussão, chamo atenção para a análise do Alexandre Linck, do Quadrinhos na sarjeta, sobre as duas vertentes existentes dentro da gibisfera – a colecionista e a crítica – como que o desenvolvimento gradativo do nichamento do próprio mercado faria com que a primeira fosse perdendo cada vez mais força e visibilidade. Um reflexo da diminuição do público de leitores de quadrinhos e principalmente dos lombadeiros. 

Outro diagnóstico bastante interessante foi o realizado pelo pessoal do Yellow Cast que apontou, entre outras coisas, a falta de uma estrutura de marketing das editoras e como o processo de seleção de parceiros é uma forma de terceirização deste trabalho. Algo que se reflete no alto nível exigido nas entregas, além da obrigação da postagem. 

Vamos ficar atentos ao processo de parcerias deste ano e ver se algo mudou de lá para cá.

É ou não é quadrinho? (Fevereiro) 

Ainda no começo do ano, outra discussão que movimentou a gibisfera, influencers, acadêmicos e quadrinistas foi, a já antiga discussão: é ou não é quadrinho? Tudo graças a uma tirinha do perfil “hmmfalemais” publicada pelo jornal Folha de São Paulo.

tirinha hmmmfalemais
Print do Instagram

Um dos primeiros a levantar a problemática foi o editor da Guará Rapha Pinheiro em seu perfil no Twitter. Sua postagem acabou se tornando um dos pontos focais da discussão, trazendo uma série de outros quadrinistas que corroboram a ideia de que a tirinha não era um quadrinho. 

Na contramão das opiniões e buscando aprofundar o tema, a pesquisadora e crítica Maria Clara Carneiro, participante do Balbúrdia, trouxe algumas reflexões acerca da constituição do Quadrinho. O principal ponto levantado pela pesquisadora da defesa em relação ao trabalho do “hmmfalemais” é que:

O quadrinho, afinal, é uma arte que demanda uma montagem da página para criar o efeito plástico e narrativo. E a montagem se organiza por seleção e composição. É uma criação artística, mesmo com recursos pré-existentes.

Para saber mais sobre, eu recomendo que vocês se aprofundem no texto escrito por ela para o site Mina de HQ e que vocês podem ler aqui e depois tirem um tempo para refletir sobre a plasticidade da mídia Quadrinho e como que certos estranhamentos, são apenas estranhamentos mesmo. 

Por aqui, sou do time que a tirinha publicada pelo jornal paulista é sim quadrinho, mesmo que eu não seja tão fã assim do formato.

“Laerte, não entendi” (Março)

Já em março, o que vimos foi a repercussão da fala da Laerte sobre a enxurrada de memes, sobre entender ou não as suas tirinhas, como respostas às suas publicações no Twitter.

Em entrevista à jornalista Ana Paula Amorim, a quadrinista falou: 

Todo mundo falando que não entendeu, ou que entendeu, o que acha que entendeu, mas sem nada, não é uma conversa, é uma espécie de bombardeio. […] Qual a origem disso? A origem disso é que alguém acha que tem uma coisa para ser entendida e que o universo tá sacaneando ela, porque ela não pegou o sentido da coisa.

Vocês podem ver a entrevista aqui e ouvir um pouco mais da Laerte sobre o tema aqui. Porém, dentre os vários comentários que surgiram da fala da quadrinista, destaco um pequeno fio produzido pela, também quadrinista, Helô D’Angelo onde ela dá dicas de como interpretar uma obra de arte. Algo que, à primeira vista, é simples, mas que requer um pouco de prática.

No entanto, entendendo ou não, o trabalho da Laerte é fundamental, primoroso e deve ser valorizado, já que ela é uma das nossas grandes artistas contemporâneas. Por isso, espero muito que a exposição Trans Laerte, que faz um recorte dos cinquenta anos de sua produção, rode o Brasil.

laerte não entendi
Arte de: Lafa

FunkToon, a Guará e o seu plano de dominação mundial (ainda em Março)

Também em março tivemos o lançamento da plataforma de webtoons da editora Guará, a FunkToon. Com um aplicativo desenvolvido para Android e IOS em parceria com a Media Bridge, a editora brasileira chegou com os dois pés na porta de forma a se tornar referência no mercado e também fomentar a leitura de obras nacionais.

Contando com material oriundo do catálogo da editora, além de material selecionado de grandes nomes do quadrinho nacional, como Laerte, André Dahmer, Helô D’Angelo, Carlos Ruas e Guilherme Infante. Isso sem falar na área voltada para os independentes. 

É possível dizer que a plataforma foi um sucesso estrondoso, chegando ao número de  200 mil leituras em seu primeiro mês de funcionamento. Ficando assim a dúvida de quão longe a FunkToon ainda pode chegar e fica a minha torcida que seja bem longe e que ela se consolide dentro do mercado.

Quadrinhos são ou não Literatura? (Abril)

Em abril, o quadrinista e empresário Mauricio de Souza concorreu em 2023 a uma vaga na Academia Brasileira de Letras (ABL) e seu então concorrente, o jornalista James Akel, realizou uma agressiva campanha dizendo que quadrinhos não são Literatura, de forma a invalidar a candidatura do quadrinista. 

No fim, nenhum dos dois ganhou a vaga, que foi para o filólogo Ricardo Cavaliere, por uma expressiva votação: 35 votos a 2 – dois membros votaram em branco. Todavia toda essa agitação ressuscitou uma antiga discussão: quadrinhos são ou não Literatura?

A rixa que se seguiu foi intensa e de novo envolveu gibitubers, influencers e acadêmicos. Se bem que, desta vez os melhores argumentos foram publicados entre os últimos e destaco as falas de Clara Matheus (do Mimimidias), que fez uma defesa de que quadrinhos são sim Literatura também. Assim como também as falas em defesa do entendimento do Quadrinho como um tipo de mídia e arte independente expressas no vídeo do Alexandre Linck, no vídeo do HQ sem roteiro, no fio do pessoal da Raio Laser e no texto da Dani Marino.

Fica aqui a minha recomendação de que se você não acompanhou o debate, retorne e leia com atenção as informações, pois ainda há água para rolar por debaixo dessa ponte. Mas, por aqui fico com o entendimento do Quadrinho como algo independente e que deva ser valorizado enquanto tal. Principalmente em editais e premiações, o que significa que as obras devam ser julgadas por pessoas que realmente entendem os meandros da nona arte.

A Intrínseca e os títulos que não vem mais (Maio)

Entra ano e sai ano e se não houver uma treta com alguma editora, aquele ano não valeu. E em maio tivemos uma apuração, por parte do pessoal do Fora do Plástico, sobre os títulos da Intrínseca que foram parar em um limbo editorial: não foram cancelados, mas também não há previsão de retomada de suas publicações. 

As séries interrompidas foram:

  • Royal City
  • Family Tree
  • Descender
  • O árabe do futuro 
  • Deuses americanos
  • Oblivion song
  • Duna
  • Biblioteca Gaiman
  • A lenda de Korra
  • Avatar: a lenda de Aang

Como é possível, não foram poucas e entre elas constam grandes nomes dos quadrinhos e séries bastante elogiadas aqui e lá fora. 

Os motivos alegados pela editora para essa decisão foram a escassez de insumos e alta no preço do papel cuchê. E que para não repassar o aumento aos clientes a editora alegou que espera um momento mais saudável para retornar as publicações.

O papo não colou muito entre os compradores e colecionadores de quadrinhos e causou um certo tremor na gibisfera. Que apontou oportunismo por parte da editora ao abocanhar os títulos de renome sem ter um planejamento prévio. Fato corroborado pelo encalhe do primeiro volume da biblioteca Gaiman, que vez ou outra aparecia quase sendo dado em promoções na Amazon. Outra ocorrência curiosa é a pausa de três séries de Jeff Lemire: Royal City, Family Tree, Descender; quadrinista que teve grande introjeção no mercado nacional e com relativo sucesso.

O preço dos quadrinhos no Brasil (Junho)

Entra ano e sai ano, um assunto que sempre movimenta o público, editores, influencers, jornalistas e críticos é o preço dos quadrinhos no Brasil e em 2023 não poderia deixar de ser diferente. 

Em junho, o tradutor e crítico Érico Assis publicou uma matéria em sua coluna “Enquanto isso…”  analisando e comparando o preço dos quadrinhos publicados no Brasil, EUA e França. Se você não leu o texto, sugiro que o faça, pois a investigação, que mesmo que breve, traz dados e traça alguns paralelos bastante interessantes.

No texto, o crítico admite que o tema carece de pesquisas, mas que a resposta curta é: o quadrinho brasileiro é e não é mais caro a depender do parâmetro utilizado. Contudo, o que se sobressai no texto é em como ganhamos mal no Brasil e que a inflação dos últimos anos consumiu o nosso poder aquisitivo. E por mais que amemos os quadrinhos, eles não são itens de primeira necessidade, então como fazer para continuar a ter acesso a eles?

Essa foi a pergunta que diferentes canais e influenciadores se debruçaram e passaram a comentar os dados apresentados pelo Érico, o atual cenário do mercado de quadrinhos no Brasil e as possibilidades do leitor frente ao crescente aumento dos preços.

Um ponto de convergência entre os comentaristas foram as iniciativas Escafandro da Ultimato do Bacon e Quadrinhos para todos da Conrad. Ambas com preços bastante acessíveis ao público e com temas e autores diversos, sendo a primeira com foco em quadrinhos nacionais e a segunda incluindo autores estrangeiros.

Além disso, muito se foi dito sobre a gourmetização dos quadrinhos e como mesmo com preços cada vez mais abusivos a sensação que se tem é que o caráter colecionista, juntamente com a sensação de FOMO, ainda continuam a impulsionar uma corrida pela compra do último lançamento. 

O surgimento da Editora Tábula e a desconfiança do público (ainda em Junho)

tábula editora logoOutro evento ocorrido no mês de junho foi o surgimento da Editora Tábula. Porém, o que era para ser mais uma notícia como tantas outras, se tornou um ponto sensível, à medida que leitores foram apontando a proximidade da nova editora com a Skript, editora que acumula reclamações dentro da Gibisfera.

Muitos apontaram que seria uma espécie de rebranding da Skript, já que a editora-chefe Priscila Platen é casada com um dos sócios da editora. Além de ambas as editoras compartilharem o mesmo modus operandi: publicações financiadas via Catarse com metas muito baixas. 

O pessoal do Fora do Plástico fez um levantamento sobre a editora, assim como uma breve entrevista com a editora-chefe sobre todo esse burburinho e vale a pena dar uma olhada.

No momento em que escrevo este texto, a Tábula conta com cinco projetos no Catarse, sendo três já financiados. Assim como um festival, realizado em novembro na cidade de Florianópolis, para chamar de seu. Quanto à desconfiança do público, essa ainda persiste, ainda mais quando se recebe e-mails, via Catarse, sem nunca ter apoiado nada da editora, mas sim da Skript.

A Braba de 2023 (Julho)

Em julho, durante a San Diego Comic Con, o anúncio da coletânea Braba: Brazilian Comics Anthology. Uma parceria entre a editora brasileira Mino e a editora norte-americana Fantagraphics, tendo como cabeça do projeto o quadrinista Rafael Grampá.

Trabalhando como curador do projeto, Grampá ainda contou com a ajuda das equipes das duas editoras para selecionar os artistas desta edição. Ao todo foram 15 artistas selecionados que irão contar 13 histórias. Os escolhidos da vez foram: 

  • Amanda Miranda
  • Bruno Seelig
  • Diego Sanchez
  • Gabriel Goés
  • Jefferson Costa
  • Jéssica Groke
  • João Pinheiro e Sirlene Barbosa
  • Paulo Crumbim e Chris Eiko
  • Pedro Cobiaco
  • Pedro Franz
  • Rafael Coutinho
  • Shiko
  • Wagner William

Para a coletânea, todos os autores trabalharam com a ideia de que as histórias tinham de ser manifestos pessoais. O que por sua vez gerou uma infinidade de temas, já que cada um se apropriou de uma forma do tema. 

A coletânea será publicada simultaneamente nos dois países e está programada para julho de 2024.

O Manual de Guerrilha do Quadrinista (ainda em Julho)

Todos os dias surgem novos quadrinistas. Todos os dias alguém se apaixona pela nona arte e pega papel e caneta para contar as suas histórias ao mundo. Mas roteirizar e desenhar é só uma parte do trabalho, é preciso se profissionalizar, buscar meios de subsistência e também de publicações. Afinal de contas, arte também é trabalho duro. 

E foi pensando nisso que, em julho, o Digo Freitas idealizou o “O Manual de Guerrilha do Quadrinista” junto de uma galera com longa trajetória no universo e mercado de quadrinhos. A ideia foi de compilar ideias sobre a produção de quadrinhos, possibilidades de profissionalização e rentabilização, participação em eventos, financiamento coletivo e vários outros pontos. Um verdadeiro caminho das pedras, mas que, como eles mesmos dizem, não se propõe a ser uma verdade absoluta.

Um material excelente e que você pode conferir aqui.

Pipoca & Nanquim e seus números (Agosto)

Em um movimento bastante raro para o mercado editorial brasileiro de quadrinhos, a Pipoca & Nanquim revelou, em agosto, alguns de seus números em uma live em seu canal no Youtube. 

Durante a live, a editora informou que trabalha com uma tiragem mínima de 5.000 cópias, mas que alguns títulos chegam a oito e dez mil. Contudo, nas obras do mangaká Junji Ito a tiragem triplica, chegando a impressionantes quinze mil cópias. Mostrando assim toda a força do autor e o motivo para que todas as editoras buscassem um título ou outro para chamar de seu do autor. 

Além disso, também foi comentado os números de tiragem mínimas para reimpressões que giram em torno de três a cinco mil cópias. A editora trabalha com pesquisas com o público para identificar quais são os títulos que conseguem atingir esse mínimo para que sejam reimpressas e quais não. Deste modo, cabe a nós leitores ficarmos atentos com aquelas obras que desejamos e não deixar para muito tempo depois, mas sem perder aquela boa dose de parcimônia.

Chico Barney Comics (ainda em Agosto)

Em agosto, o jornalista Chico Barney estreou o seu canal de resenhas de quadrinhos no Youtube: o Chico Barney Comics ou CBC. Com logo inspirada na antiga editora de terror norte-americana EC – Entertaining Comics, o canal fez um sucesso estrondoso e de forma bastante rápida foi abraçado tanto pelo público, quanto por outros influencers da Gibisfera. 

Fã de Jack Kirby, Romitinha, Quarteto Fantástico, o jornalista já puxou o coro pela prisão Geoff Johns e vem denunciando a tendência nos quadrinhos de super-heróis norte-americanos em se transformarem em storyboards ao se esquecerem de ferramentas particulares da mídia. 

Muito do sucesso do canal vem da verve mais humorística do jornalista que, aliada a um profundo conhecimento dos quadrinhos de super-heróis, faz com que suas resenhas ganhem um tom bastante único e capazes até mesmo de pautar o debate, como foi no caso da HQ Batman: Gárgula de Gotham do Rafael Grampá.

Uma pena que Chico Barney tenha assuntos mais sérios a tratar, como “A Fazenda” e o “Big Brother Brasil”, que o impedem de manter uma produção mais ativa no Youtube. #voltachicobarney

O Batman de Rafael Grampá (Setembro)

No mês de setembro, o quadrinista Rafael Grampá publicou o primeiro número de sua série Batman: A Gárgula de Gotham. Trazendo uma realidade, na qual o Batman decide sacrificar a identidade de Bruce Wayne para se dedicar 100% ao combate ao crime, a minissérie é publicada pelo selo Black Label e traz uma abordagem ainda mais urbana, com inspirações em São Paulo, e sombria para a cidade de Gotham.

O nome do quadrinista, juntamente com o ineditismo de ser o primeiro brasileiro a trabalhar solo numa aventura do morcego e uma forte campanha de marketing, criaram um enorme hype para a publicação. Grampá fez uma série de entrevistas e esteve praticamente presente em todos os grandes jornais, assim como em podcasts e programas para divulgar o quadrinho, furando assim a tal bolha dos quadrinhos que tanto falam. 

Porém, quando o quadrinho saiu a repercussão acabou se tornando bastante dividida entre elogiar o início do trabalho de Grampá e dizer que a minissérie carecia de um maior esmero no roteiro e que a história era mais do mesmo. Dentre as resenhas deste segundo aspecto, a que mais chamou atenção foi a do jornalista Chico Barney. Fazendo uma leitura dramática de algumas partes do quadrinho, o jornalista acabou chamando atenção para essas “falhas” no roteiro de Grampá e com isso criando ainda mais burburinho em torno da HQ.

Ainda não li, mas continuo atento às resenhas e quem sabe um dia, eu acabo pegando para ler. A minissérie ainda está em publicação e com previsão para ser concluída em 2024. 

O Catarse, as editoras, os independentes e o mercado (Outubro)

Durante os dias 21-22 de outubro, alguns quadrinistas, pesquisadores e editores levantaram a bola sobre as dificuldades atuais de conseguir publicar um projeto na plataforma Catarse. 

Na linha do tempo, que consegui recuperar, talvez a primeira a levantar a bola foi a pesquisadora Dani Marino recuperando um antigo texto do Érico Assis e se questionando se o modelo estava saturado. Isso causou um efeito borboleta e vários outros agentes dos quadrinhos nacionais passaram a se movimentar buscando responder o questionamento da pesquisadora.

Em meio à discussão, os jornalistas Gustavo Nogueira e o próprio Érico Assis forneceram algumas hipóteses:

  • Mudanças nos projetos;
  • Entradas das editoras;
  • Diminuição dos independentes;
  • Falta de adaptação do próprio Catarse;
  • Retração econômica;
  • Mudança na visão do público sobre o Catarse;
  • Mudança nos algoritmos das redes sociais afetando a entrega da divulgação dos projetos;

Também foram apontados erros bem comuns, mas que ainda persistem entre quadrinistas na hora de divulgarem as suas campanhas. Assim como a própria retração do mercado de quadrinhos no Brasil. Porém, a quadrinista Helô D’Angelo também apontou a mudança de perspectiva do público em relação aos projetos no Catarse, sendo a causa disso a entrada das editoras na plataforma. Se antes o público via no Catarse a chance de apoiar um projeto que possuía afinidade, hoje o público encara o projeto como uma pré-venda. 

Esta mudança de visão acarreta uma série de problemas para o quadrinista independente que passa a ser visto no mesmo patamar de editoras maiores. Fazendo com que as cobranças aumentassem exponencialmente.

O Fora do plástico produziu um vídeo compilando os dados e fazendo uma análise dos pontos levantados pela quadrinista e, de quebra, amarrando com o diagnóstico encontrado no Relatório Quadrinhopédia sobre o Mercado Brasileiro de Quadrinhos 2021-2022, que iremos falar abaixo.

Mas antes de prosseguirmos, é inegável que o formato e a própria plataforma do Catarse vêm dando sinais de cansaço. Algo sentindo pelo público, que vem aumentando suas críticas e pedindo por uma maior participação e engajamento da plataforma na curadoria dos projetos ali lançados. Aguardemos os próximos capítulos.

Relatório Quadrinhopédia sobre o Mercado Brasileiro de Quadrinhos 2021-2022 (ainda em Outubro)

relatório quadrinhopédia sobre o mercado brasileiro de quadrinhos 2021-2022 capa
Capa de: Guilherme Smee

Como vocês podem ter reparado, o ano de 2023 foi preenchido com notícias e tretas sobre o mercado de quadrinhos no Brasil, o preço das HQs, número de tiragens e mais uma série de outras particularidades que acabaram não entrando aqui nessa retrospectiva. 

Vendo assim de fora, o que temos é um enorme vazio de informações e foi buscando trazer um pouco de luz ao cenário que o pessoal Quadrinhopédia publicou, em outubro, um relatório com os dados do biênio 2021-2022 sobre o mercado nacional de quadrinhos.

Tendo como inspiração o “Relatório sobre a produção de um ano em quadrinhos no espaço europeu de língua francesa”, feito por Gilles Ratier, esta primeira edição do relatório brasileiro teve os seus parâmetros criados através de sugestões membros da Associação de Pesquisadores em Arte Sequencial (ASPAS) e de opiniões colhidas entre editores independentes.

Você pode acessar o relatório aqui e algumas das análises geradas vocês podem ver aqui, aqui e aqui.

Alan Moore, salvador do Brasil (novembro)

Em novembro, um dia após completar 70 anos, Alan Moore concedeu uma longa entrevista à escritora Heather Parry. Entre goles de chá, conversas sobre literatura sul-americana e escritoras do polo sul do globo, a escritora pergunta a Moore sobre o papel da magia no combate ao fascismo cada vez mais generalizado e atuante e a derrocada do capitalismo.

Na sua resposta, Moore fala sobre a função da magia: que diferentemente do que muitos acreditam, não é alcançar resultados materiais – não diretamente -, mas sim alterar estados de consciência. E para exemplificar, o mago de Northampton fala sobre a sua atuação no caso do Brasil. 

Há exatamente um ano, minha filha me enviou a carta de um jornalista brasileiro, na qual ele dizia que as eleições estavam chegando, que era Bolsonaro contra Luiz Inácio Lula da Silva. Bolsonaro era um fascista de cima a baixo, ele estava prestes a arrasar a Amazônia, expulsar os povos indígenas e tudo mais. E o jornalista me dizia que eu tenho muitos fãs no Brasil. Ele perguntou: “O senhor escreveria uma carta explicando por que todo mundo deveria votar em Lula, não em Bolsonaro, para dar um fim no fascismo no Brasil? O senhor tem cinco dias.”

Fiquei acordado até tarde e escrevi a carta que começa dizendo “Caríssimo Brasil”. Escrevi com o coração. Terminei cansado, mas ficou um texto bom. Parece que a carta foi enviada ao Lula e Lula postou para o eleitorado brasileiro e conseguiu se eleger com uma margem muito pequena.

Eu sei que não foi necessariamente por causa da carta que eu escrevi, mas vou dizer que foi. E se algum dia alguém quiser… Eu nunca tive nenhum título acadêmico para botar depois do meu nome, mas se quiserem colocar “Salvador do Brasil” em colchetes, cairia bem.

Então é isso: você tem como provocar alguma coisa porque você mexeu na sua consciência. É assim que se faz. É assim que a magia pode causar grandes efeitos na cultura a que estamos amarrados. (Tradução retirada da newsletter – Vira página – do jornalista, crítico e tradutor Érico Assis e que você pode ver aqui]

Ok, não foi um jornalista que entrou em contato com a Leah Moore, mas sim o administrador da página Alan Moore BR no facebook. Contudo, a carta veio e foi bastante comentada na época. E bem, ela funcionou, não é mesmo? [piscadela]

Acho que não teríamos forma melhor de fechar o ano de 2023 e toda essa retrospectiva. Então saudemos o mago, o escritor original: Alan Moore da Silva – salvador do Brasil.

Caso você queira ver a entrevista completa de Moore e Parry, em inglês, você pode clicar aqui.

alan moore da silva
Montagem feita por Fabiano Denardin

Os eventos em 2023

Na retrospectiva de 2022, fiz um breve apanhado falando sobre alguns eventos ocorridos naquele ano e bem, eu tentei fazer algo parecido, mas a nível nacional. E devo admitir que o projeto acabou se tornando muito maior do que as minhas forças e o meu tempo livre. 

Todavia, o que posso dizer é que são muitos os eventos voltados para quadrinhos no Brasil e que as editoras, em sua maioria sudestinas, devem voltar seus olhos para além de São Paulo.

Mas para não dizer que falei dos eventos, aqui vai uma breve compilação de alguns que consegui cobrir.

Nome Data Local Público Site
Semana do Quadrinho Nacional de Manaus 28/01 a 05/02 Manaus/AM 1500 a 2000 visitantes https://www.semanadoquadrinhomao.com/
2ª Feira Roraimense de quadrinhos 04/02 Boa Vista/ RO 1.550 visitantes Instagram
9ª edição da Semana do Quadrinho Nacional 27 a 30/01 Belém do Pará/PA Sem informações Instagram
Semana do Quadrinho Nacional 2,3 e 4/02 Macapá/AP Sem informações Instagram
Ilustra Comic Fest 2023 11 e 12/02 Sorocaba/SP Sem informações Instagram

Youtube

Cada Um No Seu Quadrinho 26/03 Rio de Janeiro/RJ Sem informações Instagram
FATECon HQs 12 e 13/05 São Roque/SP Sem informações Instagram
PocCon 31/05 a 01/06 São Paulo/SP Mais de 12 mil visitantes Site
Instagram
Fuzuê Nerd 18 e 19/03 Floripa/SC Sem informações Instagram
Bienal de Quadrinhos 07 a 10/09 Curitiba/PR Mais de 15 mil visitantes Site

Instagram

Espero conseguir fazer um trabalho melhor em 2024 e quem sabe preparar um material à parte, compilando os eventos ocorridos no ano. Mas por enquanto é só uma ideia, pois de novo, existem muitos, mas muitos eventos de quadrinhos acontecendo por aí.

Obituário

Deixo aqui a minha homenagem àqueles que se foram em 2023. 

All Jaffe

Nascimento: 13 de maio de 1921

Morte: 10 de abril de 2023

Bob de Groot

Nascimento: 26 de outubro de 1941

Morte: 17 de novembro de 2023

Carlo Ambrosini

Nascimento: 15 de abril de 1954

Morte: 1 de novembro de 2023

Carol Cospe Fogo

Nascimento: 6 de fevereiro de 1983

Morte: 4 de julho de 2023

Chris Browne

Nascimento: 16 de maio de 1952

Morte: 5 de fevereiro de 2023

Francisco Ibanez

Nascimento: 16 de março de 1936

Morte: 15 de julho de 2023

Ian Gibson

Nascimento: 20 de fevereiro de 1946

Morte: 11 de dezembro de 2024

John Burns

Nascimento: * 1938

Morte: 29 de dezembro 2023

John Romitta

Nascimento: 24 de janeiro de 1930

Morte: 13 de junho de 2023

Joe Giella

Nascimento: 27 de junho de 1928

Morte: 21 de março de 2023

Negreiros

Nascimento: * 1955

Morte: 22 de março de 2023

Oscar Salas

Nascimento: * 1957

Morte: 6 de fevereiro de 2023

Paulo Caruso

Nascimento: 5 de dezembro de 1949

Morte: 4 de março de 2023

Ral

Nascimento: 20 de fevereiro de 1951

Morte: 28 de maio de 2023

Os prêmios de 2024

Com o intuito de manter a memória e retratar uma fotografia do tempo, segue abaixo a lista de premiações que acompanhei durante o ano.

Vencedores Troféu HQMix 2023

Link: https://blog.hqmix.com.br/noticias/vencedores-35-edicao/

Desenhista Nacional

Marcelo D´Salete por Mukanda Tiodora (Editora Veneta)

Roteirista Nacional

Vitor Cafaggi por Franjinha: Contato (Editora Panini)

Novo Talento – Desenhista 

Helô D´Angelo por Nos Olhos de Quem Vê (Harper Collins)

Novo Talento – Roteirista: 

Helô D´Angelo por Nos Olhos de Quem Vê (Harper Collins)

Arte-Finalista Nacional

Marcelo D´Salete por Mukanda Tiodora (Editora Veneta)

Colorista Nacional

Lelis por Em Fuga (Skript Editora)

Relevância Internacional

Ricardo Leite

Grande Mestre do Quadrinho Nacional

Michele Iacocca

Adaptação para os Quadrinhos

Barrela, de Plínio Marcos e João Pinheiro (Brasa Editora)

Produção para Outras Linguagens:

Calaboca e Escuta (curta-metragem)

Edição Especial Estrangeira

Coleção Toppi Vol. 01 – América Latina, de Sergio Toppi (Figura Editora)

Edição Especial Nacional

Em Busca do Tintin Perdido, de Ricardo Leite (Editora Noir)

Livro Teórico

Balões de Pensamento 2 – Ideias que Vem dos Quadrinhos de Érico Assis (Balão Editorial)

Publicação de Aventura/Terror/Fantasia

Franjinha: Contato de Vitor Cafaggi (Editora Panini)

Publicação de Clássico

Little Nemo Vol. 1: 1905 –1909 de Winsor McCay (Figura Editora)

Publicação de Humor

Linha do Trem: É o que tem pra hoje de Raphael Salimena (Editora Draco)

Publicação de Tira

Linha do Trem: É o que tem pra hoje de Raphael Salimena (Editora Draco)

Publicação em Minissérie

Almanaque Guará, vários autores (Editora Universo Guará)

Publicação em Minissérie

10 Dias Perdidos de Sam Hart (independente)

Publicação Independente de Grupo

Café Espacial #20 (independente)

Publicação Independente de Grupo

Revista Mina de HQ #03 (independente)

Publicação Independente Edição Única

Roses N´ Guns de Gabriel Arrais e Thiago Ossostortos (independente)

Publicação Independente Seriada

Como Fazer Amigos e Enfrentar Feiticeiros, de Gustavo Borges, Eric Peleias (Independente)

Publicação Infantil

Amantikir de Lillo Parra e Jefferson Costa (Editora Trem Fantasma)

Publicação Juvenil

Anjinho: Além de Max Andrade (Editora Panini)

Publicação Mix

Almanaque Guará #09 ao #12 (Editora Universo Guará)

Projeto Editorial

Metamaus de Art Spiegelman (Companhia das Letras)

Projeto Editorial

Fronteira Híbrida de Luiz Gê (MMarte Editora)

Projeto Gráfico

Colorbar de Daniel Breta (independente)

Editora do Ano

Comix Zone

Evento

11ª Edição do FIQ BH 2022

Exposição

Shimamoto: Mestre do Quadrinho Brasileiro

Mangá e Produções Correlatas 

Nausicaä do Vale do Vento de Hayao Miyazaki (JBC)

Homenagem Especial (empate)

50 anos do Salão Mackenzie de Humor e Quadrinhos

Mônica 60 anos

Grande Contribuição

Programa Brasil em Quadrinhos

Web Quadrinhos

Homem-Grilo de Cadu Simões e Fred Hildebrand (https://homemgrilo.com/)

Web Tira

Cartumante de Cecília Ramos (https://www.instagram.com/cartumante/)

Trabalho de Conclusão de Curso

A imagem como forma de combate ao preconceito: a elaboração de uma história em quadrinhos com temática lgbtqiap+ (por Gustavo Paiva Cardozo de Mello)

Dissertação de Mestrado

De passagem para ficar a banda desenhada documental como registro da nova leva migratória brasileira para Portugal (por Christiano Mascaro Gonçalves da Silva)

Mangás do grupo CLAMP: um estudo sobre o seu processo criativo e a publicação de suas obras no Brasil (por Maiara Heleodoro dos Passos)

Tese de Doutorado

Histórias em quadrinhos e feminismos na França: a revista Ah! Nana! (1976 – 1978) (por Natania Aparecida da Silva Nogueira)

Vencedores Troféu Angelo Agostini 2023

Link: https://aqc-sp.com.br/2024/01/30/vencedores-do-39o-trofeu-angelo-agostini/

Lançamento

Nos Olhos de Quem Vê de Helô D’Angelo (editora HarperCollins)

Lançamento independente

Amarras de Cecília Marins, Barbara Teisseire e Giulia Tartarotti

Lançamento infantil

Afeto de Natália Sierpinski e Vivi Melancia (editora Outside.co)

Fanzine

Papo de Mulher: Almanaquezine de fotonovelas de Danielle Barros, organizadora

Web quadrinho
As Tiras da Helô D’Angelo de Helô D’Angelo

Roteiristas

Nos Olhos de Quem Vê de Helô D’Angelo (editora HarperCollins)

Desenhista

Nos Olhos de Quem Vê de Helô D’Angelo (editora HarperCollins)

Colorista
Mariane Gusmão por O Menino Rei

Cartunista, chargista ou caricaturista

Laerte Coutinho

Prêmio Jayme Cortez:
PerifaCon

Mestres do Quadrinho Nacional

Adriana Melo, Érica Awano, Laudo Ferreira e Nilson Azevedo

Vencedor Prêmio Jabuti 2023 – História em quadrinhos

Mukanda Tiodora de Marcelo D’Salete (Veneta)

https://www.premiojabuti.com.br/jabuti/premiados-por-edicao/premiacao/?ano=2023

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Autor: Thiago de Oliveira

Há mais de duas décadas lendo e colecionando quadrinhos. Tem mais da metade do que gostaria e menos do dobro do que queria ter. Não dispensa um pão de queijo, um café e uma cerveja.

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